No cenário desafiador da gestão de resíduos sólidos, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), sob a égide da Lei nº 12.305/10, emerge como um farol orientador. Longe de ser apenas um conjunto de normas, essa legislação redefine a forma como o país encara o desafio do “lixo”, impondo transparência e responsabilidade tanto aos setores públicos quanto aos privados.
O descompasso entre consumo e destinação adequada
O constante aumento do consumo nas cidades é um fato incontestável, mas o destino final dos resíduos sólidos urbanos não tem acompanhado essa escalada. A destinação inadequada ameaça o equilíbrio dos ecossistemas, contaminando solo, corpos d’água e atmosfera, prejudicando não apenas o meio ambiente, mas também a saúde humana.
Adicionalmente, esse descompasso resulta no desperdício de um potencial significativo. Muitos objetos poderiam ser reciclados ou reaproveitados, representando não apenas uma economia de recursos naturais e financeiros, mas também uma redução nas emissões de CO2 que tanto desequilibram o a camada de ozônio.
A revolução de 2010: lei nº 12.305 e a instituição da PNRS
O ano de 2010 testemunhou um marco transformador com a sanção da Lei nº 12.305 e a instituição da Política Nacional de Resíduos Sólidos, regulamentada pelo decreto 7.404/10. Essa legislação revolucionária não se restringiu apenas a uma categoria específica de resíduos, abrangendo desde os domésticos até os industriais e os perigosos, estabelecendo uma visão abrangente e integrada.
Objetivos claros para um futuro sustentável
A PNRS delineou 15 objetivos, traçando um caminho claro em direção a um futuro mais sustentável, sem a necessidade de recorrer à terminologia já desgastada. Entre esses objetivos, destacam-se a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental, a promoção da gestão integrada de resíduos sólidos e a articulação entre diferentes esferas do poder público e o setor empresarial.
Instrumentos para a efetividade da PNRS
Como traduzir esses objetivos em ações tangíveis? A PNRS prevê instrumentos eficazes, como a promoção da coleta seletiva e da reciclagem, a implementação de práticas de educação sanitária e ambiental, bem como o estímulo à logística reversa. Dois pontos merecem destaque nesse contexto:
- Redução de resíduos e o fim dos lixões: A PNRS estabelece metas claras para a redução dos resíduos gerados, incentivando práticas de reciclagem e reaproveitamento. A meta de “eliminação e recuperação de lixões” está vinculada à inclusão social e à emancipação econômica de catadores, transformando o descarte inadequado em uma oportunidade para produção de biogás, minimizando assim os danos ambientais.
- Responsabilidade compartilhada e logística reversa: Antes da lei, o descarte inadequado de produtos gerava uma incerteza quanto à responsabilidade. Agora, a responsabilidade compartilhada é claramente definida, envolvendo todos os participantes da cadeia produtiva. A análise do ciclo de vida do produto impõe responsabilidades a comerciantes, fabricantes, importadores, distribuidores, cidadãos e prestadores de serviços de manejo de resíduos, fomentando a logística reversa como uma prática essencial.
Dez anos de espera para publicação do decreto
Entretanto, a implementação plena da PNRS enfrenta desafios significativos. A extinção de lixões e a criação de planos de gerenciamento ainda são metas em processo, com lixões persistentes e a falta de adequação em alguns aterros. Apesar das metas ambiciosas, problemas na execução revelam a complexidade da transição para um modelo mais sustentável.
Após uma espera que se estendeu por mais de uma década, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares) foi finalmente estabelecido pelo Decreto Federal Nº 11.043, datado de 13 de abril de 2022, passando a vigorar em todo o território nacional.
Desenvolvido por meio de um Acordo de Cooperação Técnica entre o Ministério do Meio Ambiente e a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE), o Planares traz consigo diretrizes, estratégias, ações e metas, visando modernizar a gestão de resíduos sólidos no país. Essas medidas têm o propósito de colocar em prática os objetivos delineados na PRNS.
O Plano reitera a determinação de encerrar todos os lixões no país até 2024. Conforme os dados do Panorama dos Resíduos Sólidos 2021 da ABRELPE indicam, a destinação inadequada de resíduos para aterros controlados e lixões a céu aberto continua a receber quase 40% do total de resíduos coletados, equivalente a 30,3 milhões de toneladas anuais. Essa quantidade seria suficiente para preencher 765 estádios do Maracanã, impactando diretamente o meio ambiente e a saúde de 77,5 milhões de pessoas.
Ao implementar as metas para cumprir diversas disposições da Lei, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares) fixa um aumento progressivo na recuperação de resíduos, estipulando uma meta de 50% de aproveitamento ao longo de duas décadas. Dessa forma, metade dos resíduos produzidos será valorizada por meio de práticas como reciclagem, compostagem, biodigestão e recuperação energética. Esse avanço é significativo quando comparado ao cenário atual, onde apenas 3% dos resíduos sólidos urbanos são recuperados.